Desejo

Quais são os seus maiores desejos?

Nas últimas semanas estive imersa nesta nem tão simples questão. Tendo jogado na Mega Sena da Virada, me vi sonhando sobre aquilo que gostaria de fazer, em que investiria, como passaria o tempo caso tivesse à minha disposição todo o dinheiro do mundo (ou todo o prêmio da Mega da Virada, pelo menos).

Afinal, com o que se preocupa uma pessoa que tem mais de 500 milhões de reais na conta? Sei que algumas delas continuam trabalhando, embora eu mesma não entenda muito bem o porquê. Isso me fez pensar nos meus desejos para além das necessidades. Para muito além do pagamento do aluguel, do plano de saúde, da ração do cachorro, da conta de luz e gás.

Devo admitir que tenho certa dificuldade em aceitar que tenho desejos banais. Gosto logo de pensar que abriria uma ONG, uma fundação para estimular pesquisas no Brasil, que compraria uma casa para pai, mãe e tias. Que faria o que fosse necessário para que jamais faltasse nada ao meu irmão, pelo contrário, que ele tivesse um surplus de conforto.

Mas tenho dificuldade em dizer, para mim e para os outros, que talvez meu desejo seja ter uma família com saúde. Ser amada. Ir para o parque com os meus muitos cachorros que terei quando for milionária. Já falei disso em terapia, mas o meu incômodo foi tão grande que encerrei este assunto rapidamente. Hoje, meses depois deste episódio, me forço a reavaliar esse incômodo e a encarar esse medo de ser um ser desejante.

A chance de ganhar a Mega Sena — agora já infelizmente enterrada, só acertei um número dos seis sorteados — abriu para mim um mundo de possibilidades que sequer considerava no passado. Tracei planos. Escolhi uma casa. Enchi carrinhos em lojas online que jamais finalizarei. Olhei passagens de avião, em primeira classe, para Tóquio. Imaginei que poderia, com a Mega, abandonar o medo de não ter recursos suficientes para criar filhos como gostaria de criá-los. Encarei de frente que, afinal, eu talvez não seja tão contra a ideia de (eu) ter filhos como imaginava ser. Que medo pensar nessas coisas! E, ao mesmo tempo, que bom que não minta mais para mim mesma.

Desejar. O grande e o banal. É tudo desejo, ambição, pulsão de vida. Não existe mais em mim uma moralidade do desejo como já existiu num passado próximo. Ela vai diminuindo aos poucos, conforme a maturidade vai crescendo. E quem sabe os desejos mudem amanhã ou depois?

O importante é desejar. É o que faz a vida fazer sentido.

" Desejo, necessidade, vontade

Necessidade, desejo, é

Necessidade, vontade, é

Necessidade"

— Arnaldo Antunes / Marcelo Fromer / Sérgio Britto